18.8.06

Mário Quintana já dizia que:

"A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa... e, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita".

Daí eu pergunto: discutir a relação é mais ou menos por aí, não? Você pensa uma coisa. Diz outra. Entendem justamente o que vc não pensou. E o pior: não falou. E no final das contas, o questionamento que fica é: “de quem foi a idéia infeliz de abrir a boca?!?”

Vai ver o ideal mesmo é abrir só o coração. As palavras acabam acompanhando o que ele tem a dizer.

Se o outro coração não acompanhar?

Bom, nesses casos o ideal é não abrir mais a boca. Nem o coração. Abra a porta e convide-o a se retirar.

14.8.06

Ciclos

No meio da noite eu senti medo
E no meio do dia eu senti fome

O medo foi de dar errado
A fome, do que deu certo

Na noite fria eu me senti só
No dia quente eu me senti nua

A solidão foi pela tua falta
A nudez, de sentimentos

Ontem eu tive certezas
Hoje eu tenho perguntas

As certezas se desfazem
As perguntas não são feitas

E no meio da noite eu vou sentir medo
E qd o dia amanhecer, virá a fome.

O medo vai iniciar o ciclo
que se renova até que venha a fome.

11.8.06

Carta a um traidor

Sim, eu sei vc não é um traidor. Ng que trai o é, mesmo que provem o contrário, mesmo que as evidências gritem, que os fatos surjam, que as máscaras caiam, que as palavras firam, que o olhar de vidro diga, que o mundo de farsas caia. Mesmo que nada mais reste, que nada mais valha, que nada mais fique, que nada mais saia.
Não me culpo por ter te beijado com os meus olhos bem fechados, por ter sonhado com finais felizes, por te receber todas as vezes como se fosse a primeira, por ter te resgatado do seu mundo preto e branco, por te fazer acreditar ser mais interessante do que na verdade vc realmente é, por te mostrar que nem todas as pessoas são sujas, mesquinhas e falsas e que mesmo que pareça nem tudo está perdido.
Não me arrependo de ter te mostrado que no simples pode-se encontrar o belo, na lama pode-se encontrar saída, no nada pode-se encontrar a luz, no fim pode-se encontrar um novo caminho.
Eu te conduzi pelo labirinto de um amor que vc nunca soube valorizar com as suas atitudes tortas, seus gestos vazios, suas palavras frias, seu despreparo nato. E agora que te soltei vc vai se perder. Vai não pq eu assim o queira, mas pq vc não sabe para onde está indo, pq vc só toma rumos errados, pq vc cansa antes de concluir algo, pq vc até deve ter para onde voltar, mas não vai encontrar amor, apenas abrigo. Não vai encontrar calor, apenas mormaço. Não vai encontrar sentimentos sólidos, apenas fumaça. Não vai encontrar banquete, apenas migalhas. Não vai encontrar nada, apenas rastros.
A grande ironia disso tudo é pensar em quem foi mais enganado com isso tudo, quem viveu mais afogado em mentiras, já que todos os beijos intermináveis, todos os “eu te amo”, todos os momentos felizes, todas as demonstrações de afeto, todas as declarações, todos os sentimentos que te dei não eram seus. Dei tudo isso para a imagem que eu fazia de vc, para alguém que vc nunca foi, para um ser que nunca existiu, para alguém que vc criou, mas que não chega nem perto de ser vc. Esse aí que eu vejo em vc agora... esse eu nunca amei, nunca odiei, nunca senti nada pq não é merecedor de nenhuma emoção por menor que seja.
Agora só te resta descer do palco, o show acabou. E saiba que apesar de tudo eu não te culpo por ter me dado espinhos enquanto eu te dei flores: cada um dá aquilo que tem.

9.8.06

Ensaio de uma vida banal

Acordei naquela manhã de tempestade interior me sentindo incompleta. Seria bom se eu olhasse para mim mesma e me visse pela metade. Mas não. No chão daquele quarto escuro encontravam-se esparramados mais de mil pedaços do que um dia eu fui. No peito uma dor que chegava a parecer física e que falava de ausências emocionais. E que gritava falências sentimentais. Olhei para os lados e a cama tão vazia quanto o depositário em que guardo minhas esperanças parecia já cansada de tanto sentir o peso do meu corpo e das minhas repetidas lamentações.
_ Bom dia pedaços do que sobrou de mim. Murmurei baixinho. Mas por que baixinho? O tom da minha voz não faz a menor diferença agora.
Estar em posição vertical, um dia eu soube o que era isso. Brinquei com a minha própria dor.
As plantas reclamavam água, os meus gatos talvez nem sejam mais meus e a poeira acumulada nos livros nunca lidos quase conseguiam deixar o meu nariz tão irritado quanto os meus nervos, tão maltratados nos últimos anos de um relacionamento que nunca foi feliz, nem mesmo quando nos esforçávamos para parecer que éramos.
O telefone toca. Corro para atender e não... Não é ele, óbvio. Por que razão alguém que foi embora deixando apenas um bilhete me telefonaria? Por que razão alguém que nunca falou em amor me passaria um pouco do calor humano que eu precisava naquele momento? Oras, como sou tola, às vezes. Como sou tola quase sempre.
Do outro lado da linha a secretária do meu curso de artes tenta estabelecer um diálogo.
_ Boa tarde, senhora. O motivo desta ligação é que notamos que a sua ausência às aulas tem sido constante.
Ela notou a minha falta. Por um instante me comovi e confesso que cheguei a ensaiar um sorriso amarelo que nunca chegou a ser.
_ Constatamos que o pagamento da mensalidade venceu há 5 dias e ainda não foi efetuado.
Maldito mundo capitalista! Desanimei.
Ela continuou falando automaticamente. Sim, exatamente como quem parece ser paga para simular uma gravação. Em alguns momentos eu já nem sabia mais dizer se falava com uma máquina ou com um ser humano. Deus! Será que não sei mais distinguir tão sutil diferença?
_ Gostaríamos de lembrar que caso a senhora precise faltar mais um dia, mesmo com a mensalidade quitada o seu certificado de conclusão do curso não poderá ser emitido. Há algum motivo especial para tantas faltas seguidas, senhora?
_ Sim, há. Eu me quebrei em mil pedaços.
_ Como senhora?
_ Isso mesmo. Os pedaços são tantos que agora não consigo me juntar para sair desse quarto. Aliás, nem da cama eu consigo levantar.
_ Oh, céus!!!! A senhora precisa de um médico? Fraturou alguns ossos?
_ Esquece, querida. Em meia hora o que sobrou de mim estará aí.
Em duas horas eu, minhas olheiras, meu cabelo descolorido e meu corpo desengonçado conseguimos chegar ao local. Antes tarde do que... não, não vou continuar. Muito clichê e em minha vida embora haja vazio não há mais espaço para clichês. Antes tarde, apenas isso e ponto final.
_ Vc está atrasada. O professor me recepcionou.
_ Como sabe? É exatamente assim que me sinto: atrasada. Atrasada alguns anos. Atrasada algumas vidas até, considerando-se a visão daqueles que se dizem espiritualistas.
_ Não entendi. Sente-se a aula já começou faz tempo.
Sento-me e diante da tela em branco vejo apenas um ponto. Ele está lá, bem no meio do papel. Um ponto e nada mais. Imagino que aquele ponto tão solitário sou eu. E o meu primeiro ímpeto foi pintar todo um precipício abaixo dele e assisti-lo cair em queda livre até se confrontar com o solo áspero. Áspero, mas quente.
Trágico demais. Tento pensar em algo mais ameno, afinal de contas dizem que a vida é feita de amenidades. Por que não dar ao ponto feições de estrela e presentear-lhe com todo um Universo ao seu redor? Sim, era isso. Transformar aquele ponto em estrela é mais fácil do que transformar a minha frívola existência em algo menos banal.
Transformo aquele ponto em uma estrela cadente. Sim, cadente porque a idéia de cair parece ainda não ter saído da minha cabeça. E lá está ela: meio perdida, mas ainda assim estrela, brilhante, imponente, poderosa. Assim como eu. E com pincel em mãos a arte se inverte: não sou mais eu quem dou vida aquela tela: é ela quem parece me fazer viver.
Termino minha obra e a assino com ares de quem finge ser artista. Em algum momento alguém me olha como quem acredita. É, assim é a vida. E confesso que nessa altura do campeonato já nem sei mais se isso é bom ou ruim.
Levanto-me e vou embora antes da aula terminar. Não me importo mais com esses detalhes: começo e fim. O importante é o caminho entre um e outro.
Já em casa, começo a tirar a poeira daqueles livros nunca lidos. E em determinado momento vejo que se eu não me negasse a leitura de cada um deles, teria percebido que nenhum ponto final marca obrigatoriamente um fim. Traçar ou não uma nova linha é a parte que compete a nós. É hora de continuar a tirar a poeira, só que agora da minha memória.

8.8.06

Palavras e atitudes

_ Eu vou ter um romance.
_ Com quem?
_ Com as palavras.
_ Ah, eu sou mais as atitudes.
_ Mas palavras comovem.
_ Atitudes convencem.
_ Palavras são belas.
_ Atitudes são fortes.
_ Palavras tocam o coração.
_ Atitudes fazem a gente perceber pq é que ele bate.
_ Poxa, agora vc me deixou na dúvida. Sou fiel, só posso escolher uma.
_ A decisão é sua, só quis dar a minha opinião.
_ Vou ficar com as palavras, sei lidar melhor com elas.
_ Imaginei.
_ Pq?
_ Pq geralmente é assim mesmo: todo mundo sabe usar as palavras, uns mais, outros menos. Já a atitude não é do tipo que se use: vc tem ou não tem.

6.8.06

Bons homens e o bom velhinho: alguma coisa em comum?

_ Estou namorando!
_ Bacana. E como ele é?
_ Sério, fiel, gentil, educado, romântico, atencioso.
_ Só falta vc dizer que ele não curte futebol e que a mãe dele é o máximo.
_ Ah, amiga, então não falta mais nada! Está feliz por mim?
_ Talvez...
_ Como assim, talvez?!?
_ Desculpe, mas acho que homens assim são como o papai noel.
_ Não existem?
_ Existem, mas como o bom velhinho. Ou seja, eles aparecem na nossa vida pelo menos uma vez por ano. Vc abraça, beija, toca, escreve algumas cartas dizendo que o adora e fazendo mil pedidos que podem vir a ser realizados ou não. Vc até tira fotos ao lado dele para guardar de recordação. Mas embora esteja ali na sua frente, tudo é uma espécie de fantasia.
_ Fantasia?
_ Sim. No final das contas, assim como o papai noel que vemos no shopping, homens como o que vc descreveu tiram toda aquela roupagem e são apenas seres humanos normais, com todos os seus erros e acertos. Nada de fantasia, mas talvez a realidade não seja tão má.
_ Pode ser que vc tenha razão. Só espero que após o natal que estamos vivendo a magia não termine.
_ É possível. Se ele não fugir com as renas, é só lembrar que ng é perfeito o ano inteiro.

5.8.06

Poema título

Hoje a tua boca veio encontrar a minha
E as tuas mãos buscaram tocar as minhas
E o teu corpo só se aqueceu com o meu calor

Hoje eu mesmo vestida ao seu lado estive nua
E mesmo falando tanto estive tão muda
E embora atenta ao te escutar, só te senti

Hoje eu fui apenas eu e nada mais
E você foi apenas meu, de ninguém mais
E já não mais importa o caos de instantes atrás

Porque amar é preciso.
Porque viver é preciso.
Mas flutuar é fundamental.

Porque Viver é Preciso

Não, esse não é apenas o título desse blog recém criado e muito mal inaugurado. É muito mais. É a razão pela qual eu o criei. Para quem acha que esse pode vir a ser um espaço de encantamento, eu digo que não. É um espaço de desafogamento, apenas isso e nada mais. Porque da mesma forma que o mestre Fernando Pessoa, sinto que numa parte do dia “perco-me em mim mesma por ser labirinto”. E na outra parte também. E nessas linhas eu algumas vezes vou optar por me encontrar. Em outras não. Afinal de contas nem sempre é tão ruim não saber todas as respostas, perder a bússola, conviver com a incerteza se o domingo será de chuva ou de sol. Porque para alguns intuição, emoção e paixão representam perigo. Para mim? Absolutamente NÃO.

Breve explicação ou... para bom entendedor meia palavra basta!

"A Vida é tudo aquilo que acontece enquanto fazemos planos". O título desse blog surgiu dessa frase. E talvez a minha forma de levar a vida também.